Atravessamos longo e penoso deserto, um tempo sombrio e assustador… um tempo tão assustador que vivemos a fugir dos outros por exigência legal e imperativo sanitário. Um tempo em que falta o mais importante… a relação… a afetividade… a comunidade.
Queremos, ainda assim, celebrar plenamente esta Páscoa. Que seja verdadeira Passagem sendo que é isso que a palavra Páscoa etimologicamente significa.
A liturgia não pode ser um simples momento separado da nossa vida corrente. Não existe liturgia fora da vida. Nem a liturgia é uma simples pausa na vida.
Se vou à Igreja é porque sinto que tenho lá o meu lugar, entre irmãos, para rezar e participar no culto vivenciado e partilhado com todos os que, como eu, buscam a Deus.
Rezar em comunidade é aprender a caminhar com os outros e descobrir que precisamos de Cristo, vivo e ressuscitado.
Cristo que supera a vida, que supera a morte, que faz de tudo para superar as situações de escravidão. Cristo que nos ensina como deixar o túmulo vazio e transmitir alegria, sentido e vida em abundância.
Demasiados na nossa cultura se deixaram fechar no túmulo da economia, no túmulo do lucro, no jazigo do ego… Sobram em tantos cantos da terra casas e carros e noutros lugares falta o essencial do alimento. Tanto se gasta em armas e guerras e falta acesso à saude e a cuidados e bens essenciais para grande parte da humanidade.
O mundo ainda desconhece Cristo vivo e ressuscitado que hoje anunciamos. Permanece fechado dentro do túmulo procurando o sentido e a felicidade em lugares errados.
Celebrar a Páscoa é celebrar o túmulo vazio, é celebrar a vitória da justiça, da vida e da fraternidade. Aprendemos que tudo passa pela cruz, pela morte, mas o destino e a meta é a ressurreição.
Ser Cristão é isto. Sentir-se vivo na alegria e na esperança.
Ser Cristão é testemunhar este sentido e este horizonte que só a Páscoa de Jesus nos pode dar.
Ser Cristão é deixar o túmulo do consumo, da competição, do egoísmo vazio… e renascer as vezes que forem precisas para que a vida de cada um de nós testemunhe a alegria e a esperança Pascal.
A vida vence a morte. Sempre! A luz pode mais do que a escuridão, a comunhão é mais forte do que o isolamento, a ternura ganha à violência… De certeza que na tua vida há algo de sombra, de tristeza, de desânimo… permite-te acolher a boa notícia da Ressurreição, que te diz que até isso se pode iluminar. Acredita!
• CRER NO RESSUSCITADO é resistirmos a aceitar que a nossa vida é só um pequeno parêntesis entre dois imensos vazios. Apoiando-nos em Jesus, ressuscitado por Deus, intuímos, desejamos e acreditamos que Deus está conduzindo à sua verdadeira plenitude o anseio de vida, de justiça e de paz que se encontra no coração da humanidade e de toda a criação.
• CRER NO RESSUSCITADO é rebelarmo-nos com todas as nossas forças contra o facto de que essa imensa maioria de homens, mulheres e crianças, que só conheceram nesta vida miséria, humilhação e sofrimentos, fique esquecida para sempre.
• CRER NO RESSUSCITADO é confiar numa vida em que não haverá pobreza nem dor, ninguém estará triste, ninguém terá de chorar.
• CRER NO RESSUSCITADO é acercarmo-nos com esperança de tantas pessoas sem saúde, enfermos crónicos, incapacitados físicos e psíquicos, pessoas caídas na depressão, cansadas de viver e de lutar. Um dia conhecerão o que é viver com paz e saúde total. Escutarão as palavras do Pai: «Entra para sempre no gozo do teu Senhor».
• CRER NO RESSUSCITADO é confiar em que os nossos esforços por um mundo mais humano e ditoso, não se perderão no vazio.
• CRER NO RESSUSCITADO é saber que tudo o que ficou a meio, o que não pode ser, o que estropiámos com nossa torpeza e pecado, tudo alcançará em Deus a sua plenitude. Nada se perderá do que vivemos com amor ou do que renunciámos por amor.
• CRER NO RESSUSCITADO é esperar que as horas alegres e as experiências amargas, as «pegadas» que deixamos nas pessoas e nas coisas, o que construímos por amor, ficará transfigurado. Já não conheceremos a amizade que termina, a festa que se acaba nem a despedida que entristece. Deus será tudo em todos.
• CRER NO RESSUSCITADO é acreditar que um dia escutaremos estas incríveis palavras que o livro do Apocalipse põe nos lábios de Deus: «Eu sou o Alfa e o Ómega, o Princípio e o Fim. Ao que tiver sede, Eu lhe darei a beber de graça, da nascente da água da vida». Já não haverá morte nem pranto, não haverá gritos nem fadigas, porque tudo isso terá passado.
Celebrar a Páscoa é encontrar um oásis no deserto que atravessamos. É descobrir a luz que ilumina as trevas do tempo presente. É descobrir o que é realmente importante (vital). A nossa força toda está na esperança que a ressurreição nos trás.
Santa e verdadeira Páscoa para todos
Com o médico divino - Cristo que vive, ontem, hoje e sempre!
O pároco